Herpes zóster e alergias: relação e tratamento
O herpes zóster e as alergias são duas condições médicas que, à primeira vista, podem parecer completamente diferentes. No entanto, existe uma relação entre as duas que merece a nossa atenção. De acordo com a OMS, as alergias estão entre as seis doenças crónicas mais comuns no mundo e estima-se que afetem entre 20 e 25% da população mundial. Por outro lado, de acordo com um artigo publicado na Clinical Infectious Disease, a incidência do herpes zóster quadruplicou nas últimas seis décadas e estima-se que uma em cada três pessoas possa vir a sofrer deste durante a sua vida. Estes números mostram a importância de ambas as condições na saúde pública.
Neste artigo, iremos explorar em profundidade a relação entre o herpes zóster e a alergia, a forma como estas condições interagem e que medidas podem ser tomadas para as gerir de forma eficaz.
O que é o herpes zóster?
O herpes zóster, também conhecido vulgarmente como ‘zona’, é uma infeção viral que provoca uma erupção cutânea dolorosa na pele, causada pelo vírus varicela-zóster, o mesmo que provoca a varicela. Depois de uma pessoa se recuperar da varicela, o vírus permanece inativo no corpo, especificamente nas raízes nervosas, e pode reativar-se anos mais tarde como herpes zóster.
A reativação do vírus varicela-zóster pode ocorrer por diversos motivos. Alguns dos fatores mais comuns que podem desencadear um surto de herpes zóster incluem:
- Idade avançada. As pessoas com mais de 50 anos correm um risco acrescido de desenvolver herpes zóster devido ao enfraquecimento natural do sistema imunitário com a idade.
- Stress crónico. Situações de stress prolongado podem debilitar o sistema imunitário, facilitando a reativação do vírus.
- Doenças que comprometem o sistema imune. Doenças como o VIH/SIDA, cancro ou tratamentos imunossupressores podem aumentar a suscetibilidade ao herpes zóster.
- Trauma físico. Lesões ou cirurgias em áreas específicas do corpo provocam por vezes a reativação do vírus nesses nervos.
Os sintomas do herpes zóster desenvolvem-se normalmente por fases e variam em intensidade de pessoa para pessoa. Os sinais mais comuns incluem:
- Dor, ardor ou sensibilidade numa zona específica da pele.
- Erupção cutânea que se desenvolve em forma de faixa ou banda.
- Bolhas cheias de líquido que por vezes se rompem e formam uma crosta.
- Comichão intensa na zona afetada.
- Febre, dor de cabeça e fadiga.
É importante destacar que a dor associada ao herpes zóster pode persistir mesmo após a cura da erupção cutânea, uma condição conhecida como neuralgia pós-herpética.
O que são as alergias e como afetam o sistema imunitário?
As alergias são reações exageradas do sistema imunitário a substâncias normalmente inofensivas, conhecidas como alergénios. Estas reações podem manifestar-se de diversas formas, desde sintomas ligeiros, como espirros e comichão, até reações graves que podem pôr a vida em risco.
O sistema imunitário identifica erradamente certas substâncias como uma ameaça, o que desencadeia uma série de respostas. Em primeiro lugar, são gerados anticorpos específicos, principalmente a imunoglobulina E (IgE), concebidos para combater o que é visto como um invasor. Em encontros posteriores com o alergénio, estes anticorpos fazem com que algumas células libertem histamina e outros químicos. Esta libertação de histamina provoca inflamação e origina os sintomas característicos das alergias.
As alergias crónicas podem ter um impacto significativo no funcionamento geral do sistema imunitário:
- Hiperatividade imunitária. O sistema imunitário é mantido num estado de alerta constante, o que pode levar a uma resposta exagerada a outros estímulos.
- Esgotamento de recursos. A luta constante contra os alergénios pode esgotar os recursos do sistema imunitário, deixando-o menos preparado para combater outras ameaças reais.
- Inflamação crónica. A exposição contínua a alergénios pode manter um estado de inflamação de baixo grau no corpo, que, por vezes, afeta negativamente vários sistemas.
- Alteração da barreira mucosa. As alergias respiratórias podem danificar a barreira mucosa das vias respiratórias, facilitando a entrada de agentes patogénicos.
Relação entre o herpes zóster e as alergias
A relação entre o herpes zóster e as alergias é complexa e multifacetada. Embora estas condições tenham origens diferentes, existem vários pontos de interseção. As alergias crónicas podem favorecer a reativação do vírus varicela-zóster devido a vários fatores. A luta constante do sistema imunitário contra os alergénios pode esgotar os seus recursos, tornando o organismo mais suscetível a infeções virais como o herpes zóster. Além disso, as alergias graves causam um stress fisiológico significativo, que atua como um gatilho para a reativação do vírus. Por outro lado, as alergias podem alterar o equilíbrio das células imunitárias, afetando potencialmente a capacidade do organismo para manter o vírus em estado latente.
Tanto as alergias como o herpes zóster envolvem processos inflamatórios, embora a sua natureza seja diferente. No caso das alergias, a inflamação surge como uma resposta exagerada do sistema imunitário a substâncias inofensivas, enquanto no herpes zóster faz parte da resposta imunitária contra a reativação viral. Esta sobreposição de processos inflamatórios pode complicar o quadro clínico e dificultar o controlo de ambas as condições quando coexistem.
Investigações recentes começaram a examinar a possível relação entre a alergia e o herpes zóster, embora esta área de estudo seja, por enquanto, ainda limitada. A maioria das investigações centram-se em condições específicas, como a asma ou a dermatite atópica, que estão associados a um maior risco de desenvolver herpes zóster. É importante notar que estes estudos são preliminares sendo necessárias mais investigação para estabelecer uma relação causal definitiva.
As alergias podem agravar os sintomas do herpes zóster?
As alergias são capazes de exacerbar os sintomas do herpes zóster de várias formas. As pessoas com alergias cutâneas podem ter uma sensibilidade cutânea aumentada, com uma pele mais sensível e reativa, o que pode intensificar a sensação dolorosa e de comichão associada à erupção cutânea do herpes-zóster. Além disso, as alergias que afetam a pele podem interferir no processo normal de cicatrização, prolongando potencialmente a duração das lesões. A resposta imunitária alterada devido às alergias também pode modificar a forma como o organismo combate a reativação do vírus varicela-zóster, o que pode agravar os sintomas. Por último, o desconforto provocado pelas alergias aumenta o stress físico e emocional, complicando a recuperação do herpes zóster e piorando as suas manifestações.
Tratamento do herpes zóster em pessoas com alergias
O tratamento do herpes zóster em pessoas com alergias requer uma abordagem cuidadosa e personalizada. É crucial considerar tanto a infeção viral como a condição alérgica subjacente para um tratamento eficaz.
Os medicamentos antivirais são essenciais no tratamento do herpes zóster, com fármacos como o aciclovir, valaciclovir ou famciclovir, que reduzem a gravidade e a persistência da infeção. A duração habitual do tratamento é de 7 a 10 dias, mas pode ser ajustada de acordo com o critério do médico em função da resposta do doente e a presença de alergias.
Durante o tratamento clínico do herpes zóster é também essencial gerir as alergias: os anti-histamínicos controlam os sintomas sem interferir significativamente com o tratamento, enquanto os corticosteroides tópicos podem aliviar a inflamação alérgica, evitando a sua utilização nas lesões.
Além disso, o uso de compressas frias e banhos de aveia ajudam a aliviar a dor e a irritação. Seguir uma dieta anti-inflamatória e praticar técnicas de relaxamento ajudam a melhorar o bem-estar geral. O acompanhamento regular permite ajustar o tratamento em função da evolução e detetar eventuais efeitos secundários.
Prevenção e precauções para as pessoas com alergias
A prevenção tem um papel crucial na gestão do herpes zóster, especialmente em indivíduos com alergias. A implementação de estratégias preventivas eficazes pode reduzir de forma significativa o risco de desenvolver herpes zóster e atenuar as suas complicações.
A vacinação contra o herpes zóster é uma das medidas preventivas mais eficazes. Shingrix e Zostavax são as principais opções. Shingrix é uma vacina recombinante não viva recomendada para adultos com mais de 50 anos de idade, que tem mais de 90% de eficácia na prevenção do herpes zóster e proporciona uma proteção que se mantém elevada durante pelo menos quatro anos. Zostavax é uma vacina de vírus vivo atenuado que tem registado uma redução na sua utilização nos últimos anos. Para as pessoas com historial de alergias graves, é essencial uma avaliação por um alergologista e um acompanhamento pós-vacinação mais prolongado.
Um sistema imunitário forte é crucial para evitar a reativação do vírus varicela-zóster. Isto inclui uma alimentação adequada com vitaminas C e D, assim como minerais como o zinco e alimentos ricos em antioxidantes. A atividade física moderada, dormir adequadamente e o controlo do stress são também importantes. A adoção de um estilo de vida saudável reforça as defesas naturais do corpo. Evitar o tabaco e limitar o consumo de álcool são outras medidas necessárias, pois ambos podem enfraquecer o sistema imunitário. Por fim, manter boas práticas de higiene pessoal, como a lavagem frequente das mãos, ajuda a reduzir a exposição a agentes patogénicos e a manter uma barreira cutânea eficaz.
A gestão eficaz das alergias pode reduzir o risco de complicações. É essencial identificar e evitar os alergénios, utilizando testes de alergia e medidas para minimizar a exposição. Seguir o tratamento prescrito pelo alergologista e manter um diário dos sintomas alérgicos facilita a identificação dos fatores desencadeadores, permitindo ajustes no tratamento.
Em conclusão, as alergias e o herpes zóster são duas condições diferentes que afetam milhões de pessoas em todo o mundo. Uma vez que as alergias crónicas podem favorecer a reativação do vírus varicela-zóster e, portanto, o aparecimento de um surto de herpes zóster (zona), é importante incentivar a prevenção através da vacinação, do reforço do sistema imunitário e da adoção de hábitos de vida saudáveis. Isto irá melhorar a qualidade de vida dos doentes e reduzir o risco de desenvolver herpes zóster e complicações relacionadas com as alergias.
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